RENASCENDO DA CINZA, Wagner Martins (conto)

 


RENASCENDO DA CINZA

 

Eu estava com uma amiga passeando pelo calçadão de uma praia, aqui, perto de casa: de repente, sentir como se um inseto mordesse as minhas costas, um repentino frio!...

Raras vezes que estou na praça de alimentação, observo o desfile de corpos; conscientes ou não, definimos, tratamos as pessoas pelos seus corpos: têm os dos jovens que como lindas e vigoradas flores quando logo desabrochadas, são admirados, cobiçados — por isso julgam-se que podem tudo — assim buscam sem limites experiências passageiras; ao murcharem, só lhes restam arrependimentos de tudo que poderiam se tornarem e fazerem e não aproveitaram!

Têm os dos adultos, que como “seios das amas de leite”, são procurados, lembrados pelos seus enquanto são “mãos abertas”; quando o leite só dar para comprar os remédios e muito mal a própria feira; simplesmente esses mesmos viram invisíveis, “as cartas fora do baralho”, (geralmente os mais próximos deles, mais os evitam…) Imagine agora uma pessoa que tinha toda saúde do mundo, num só instante, levou um tiro e ficou paraplégica!

            Sabe um ser mais teimoso que existe, e que insiste em nos contrariar justo no momento mais preciso? É a tal da morte. Nossa... como desejei, implorei por ela, e não fui atendida. (O ser humano lamentavelmente não sabe valorizar o que realmente tem de valor — a vida!) “Nascesse de novo! ” Foi o que muitos me disseram; porém, nos primeiros anos de minha “nova vida”, foram pouquíssimos os que estiveram comigo, aliás, até hoje. (O dia a dia da pessoa que precisa das outras para fazer as coisas mais básicas é como ter que passar no vale de lágrimas, humilhação, desgosto, desprezo e sofrimento diariamente.)

Está na cadeira de rodas começou a tornar-se parte da minha rotina, só que quando eu não a precisava, via as que precisam — indignas da minha amizade, do meu tempo, da minha ajuda, porém, tudo isso sutilmente; agora sou uma das que não merecem serem tratadas como devem, feito pessoa, segundo a minha crueldade — nesse momento penso como sou vista pelo meu sexo oposto! (Sabe: o amanhã tem um jeito todo inusitado de nos botar na pele do outro, de nos pregar imagináveis peças, principalmente nos que se julgam que estão livres de passar por algumas situações como essa!)

(O ser humano tem uma capacidade incrível de superar!) Só descobrir isso quando perdi para sempre os movimentos das pernas. A minha vida agora, claro, não é como era antes; esforço, lágrimas, inúmeras sessões de fisioterapias... guerrilho contra a vontade de desistir, com a arma do acreditar que ainda vale apena persistir em alimentar a esperança em que viverei tudo aquilo que sonho; independente do que sofri, das feridas invisíveis cicatrizando: nesse momento, tenho um coração pulsando, sendo assim tenho sentimentos, emoções, tenho um corpo para embelezar, enfeitar, tenho escolhas e direito das consequências sejam boas ou ruins; o trágico evento que sobrevivi pôde limitar até os meus passos, contudo, não o meu ser, não a capacidade de eu realizar o que mais quero viver!

 

- Wagner Martins

 

sexta-feira, 11 de setembro de 2020


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